Sem ser repreendido por fiscais, repórter faz a prova do Enem 2011 com itens que eliminaram outros candidatos

25/10/2011

Lauro Neto RIO - Quando fiz o Enem pela primeira vez, em 2000, não fiquei tão nervoso quanto na edição deste último fim de semana. Naquela época, a prova servia no máximo para entrar na PUC e não tinha tantos aparatos tecnológicos de segurança para evitar fraudes. No sábado, tive até que tirar meu relógio analógico de pulso a pedido do fiscal. Guardei-o prontamente com meu celular num saquinho que havia trazido de casa, já que ele não me ofereceu a bolsa lacrável recomendada pelo Inep. Depois da prova, fiquei intrigado quando soube que, em diferentes partes do país, candidatos estavam sendo eliminados devido ao uso de canetas não transparentes, lápis, borracha e até brincos(!). Perguntei-me se o aplicador da prova não teria atentado para a caneta toda preta que ficou durante mais de cinco horas sobre a mesa. Também achei estranho que estudantes tivessem sido desclassificados por twittarem antes do início do exame. Em pelo menos três salas vizinhas à minha, celulares tocaram durante o tempo de prova, e seus donos foram apenas orientados a desligá-los.

Por isso, no segundo dia de prova, decidi inovar no visual: adotei não bijuterias, mas boné e óculos escuros - proibidos no edital do Enem. Comprei também um lápis com borracha na porta da faculdade, onde o vendedor garantia aos gritos: "Comprou, passou!". Novamente, o fiscal não me forneceu o saquinho e, desta vez, resolvi ousar: guardei meu celular no bolso, no modo silencioso, para não perturbar ninguém. Canetas (azul e preta não transparente) ficaram sobre a mesa, como no dia anterior. O aplicador de prova também não percebeu que vários estudantes abriram o caderno de perguntas antes de soar o sinal de início. Só depois de passada meia hora de prova, ele solicitou, educadamente, que eu tirasse o boné e o colocasse embaixo da mesa. Minutos depois, perguntou também se eu podia guardar meus óculos escuros, que estavam presos à minha camisa. Atendi-o prontamente. Bateu vontade de ir ao banheiro. Como não havia nenhum fiscal por perto, decidi testar a segurança da prova e mandei um SMS para a equipe de reportagem do GLOBO com o tema da redação: "Viver em rede no século XXI: os limites entre o público e o privado". Que ironia! Eu, em frente à privada, tornando pública uma informação através de comunicação em rede. Deu tempo até de mandar outro torpedo com os títulos e autores dos texto coletânea.

Voltei à sala, preenchi a folha de respostas com lápis, canetas azul e preta (não transparente), e dei um título à redação, pensado no banheiro: "Sorria, você está sendo eliminado!". Depois, entreguei aos fiscais e fui embora pensando: se eu fosse um aluno desesperado para entrar na faculdade, poderia até ter consultado a internet pelo celular ou trocado SMS com algum professor para tirar dúvidas...

 

O Globo - Rio de Janeiro RJ