Queda do analfabetismo adulto é residual
16/05/2011 - São Paulo SP, Folha de São Paulo
Foram poucos os que aprenderam a ler entre 2000 e 2010,
segundo o censo; redução foi de 0,5 ponto percentual.
Crianças e jovens foram principais responsáveis pela diminuição do
analfabetismo ocorrida na década passada
Edna Veiga, 76, já perdeu a conta do número de cursos de alfabetização em que se matriculou antes de, finalmente, aprender a ler. "Fiz muitos, mas nada entrava na minha cabeça. Acho que desta vez funcionou porque o professor teve mais paciência", diz ela. O fato de Edna ter aprendido a ler depois de adulta a torna, no entanto, uma exceção nas estatísticas. Um olhar mais cuidadoso sobre a década passada através do censo do IBGE mostra que, apesar de quase R$ 3 bilhões investidos pelo governo federal na alfabetização de adultos, uma vez completados 20 anos de idade, foram poucos os analfabetos que aprenderam a ler e escrever entre 2000 e 2010.
A erradicação do analfabetismo na década passada era meta do Plano Nacional de Educação -aprovado pelo Congresso- e promessa de campanha de Lula. No total da população de 15 anos ou mais, a proporção de iletrados caiu de 13,6% para 9,6%. Essa redução, no entanto, ocorreu principalmente entre crianças e jovens. Entre os brasileiros que começaram a década passada entre 20 e 49 anos, os avanços foram residuais. Uma análise da Folha nos dados do censo mostra que, em 2000, esse grupo tinha taxa de analfabetismo de 10%. Dez anos depois, portanto, com idades de 30 a 59 anos, essa geração terminou a década com uma proporção de 9,5% de analfabetos, queda de 0,5 ponto percentual.
DIREITO - Para Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a queda residual não deve levar a sociedade a desistir de alfabetizar os adultos. "É um direito constitucional. Além disso, é um investimento que também impacta a qualidade da educação dos mais jovens, pois o pai com melhor escolaridade tem melhores condições de ajudar o filho na escola", diz Cara. Ele aponta ainda falta de prioridade. "A alfabetização de adultos nunca foi prioritária na gestão do MEC (Ministério da Educação)."O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), demitido por Lula do cargo de ministro da Educação em 2004, também critica o MEC. Para ele, o governo errou ao mudar o programa Brasil Alfabetizado, que passou a valorizar na gestão de Fernando Haddad a parceria com secretarias de educação, em vez de convênios com ONGs. "As prefeituras estão mais interessadas nas crianças. A gente ia atrás dos analfabetos e pagava por adulto alfabetizado. Agora, o governo espera que os analfabetos procurem os cursos."
ANTÔNIO GOIS DO RIO