Nordeste
concentra 32 cidades do país em que pelo menos 25% são analfabetos
25/12/2011
Jornada
pesada de trabalho, cuidado com os filhos, falta de dinheiro para o transporte
ou um certo constrangimento de ocupar o banco escolar
depois de crescidos são algumas das razões que impedem adultos analfabetos de
aprender como letras se juntam e formam palavras. Vencer essas barreiras,
porém, não significa garantia de conhecer o mundo letrado. Embora o Programa
Brasil Alfabetizado, lançado em 2003 pelo ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, tenha estabelecido a abertura de turmas de
educação para jovens e adultos, também conhecida pela sigla EJA, em todos os
municípios onde 25% ou mais da população ignoram o alfabeto, há hoje 32 cidades
nessa situação, sem qualquer classe funcionando. Nesses locais, mesmo com muita
força de vontade, os habitantes dificilmente aprenderão a ler e escrever.
Miravânia,
município de 4,7 mil habitantes a 711 quilômetros de Belo Horizonte, faz parte da
porção brasileira fadada ao analfabetismo. Enquanto a oferta de turmas não
chega, a lavradora Maria da Conceição Leite, conhecida como dona Bia, lamenta
ter deixado a escola quando criança. “O meu pai era muito pobre e eu tinha que
cuidar dos irmãos mais novos. Por isso, não pude estudar”, diz a senhora de 53
anos. Moradora da localidade de Panelinha II, distante nove quilômetros da área
urbana de Miravânia, Maria da Conceição lembra que
chegou a frequentar, depois de adulta, uma classe de
alfabetização no município, mas por pouco tempo. “Fui às aulas por uns três
meses. Mal aprendi a assinar o nome. Mas, se fico apavorada, não consigo
escrever", diz a lavradora, integrante de uma família de 12 irmãos e mãe
de oito filhos.
Mesmo
achando que “a esta altura da vida” é difícil se alfabetizar, a mulher ainda
sonha em decifrar letras. “Eu queria ler a Bíblia”, diz Maria da Conceição. Edwirges Ferreira de Faria, de 48 anos e mãe de 10 filhos,
compartilha desse desejo. Evangélica, ela conta que tem vontade de poder orar
acompanhando o livro sagrado de sua religião, mas mostra um desânimo
característico dos adultos analfabetos. “Para a pessoa que já é velha, acho que
não dá para estudar mais”, afirma.
“Os
adultos analfabetos precisam de um incentivo a mais para estudar. Mas, nos
lugares mais carentes, muitos projetos são travados por questões políticas.
Para alguns políticos, é mais interessante que as pessoas continuem analfabetas
para não haver liberdade da reivindicação do exercício da cidadania e dos seus
direitos”, critica Ivanir Barbosa de Oliva Silva, que
desenvolve trabalho de articulação com associações comunitárias de Miravânia. Ela destaca que uma turma chegou a ser iniciada
no município, mas não seguiu em diante. A alegação da prefeitura, segundo a
professora, foi o custo elevado. A secretária municipal de Educação de Miravânia, Irene Vilas Boas, e o prefeito, Elpidio Mota Dourado (PTB), não retornaram o contato da
reportagem para comentar o assunto.
Falta
de interesse político, sem dúvida, é um problema generalizado, afirma Roberto Catelli, coordenador do programa de EJA da Ação Educativa,
entidade que promove cursos. Ele destaca que, aliada ao pouco interesse de
gestores públicos, está a dificuldade em localizar a
demanda por alfabetização. “Ela não é explícita como no caso de crianças fora
da escola. Você precisa mobilizar o adulto para que ele queira estudar. Então,
o Censo 2010 vem em boa hora, até para romper com o argumento de muitos
prefeitos de que não há demanda para esse tipo de programa”, diz o
especialista.
Evasão
- Tão difícil quanto mobilizar analfabetos que já passaram da idade escolar é
mantê-los nas classes ao longo dos meses. Não por acaso, a média de evasão na
educação de jovens e adultos, segundo o Ministério da Educação, é de 40%. “Esse
aluno se sente constrangido em voltar aos estudos após anos de ausência. Por
isso, o conteúdo deve ser adequado”, explica Ophelis Françoso Júnior, editor executivo de EJA de uma editora que
desenvolve material didático para as turmas de adultos. Para manter o adulto no
banco escolar, completa Catelli, além de livros e
abordagens adequadas, é preciso investimentos em áreas não necessariamente
ligadas ao tema da educação. “Um transporte eficiente, por exemplo, e creches
para os filhos dos alunos.”
Questões
culturais, sociais e econômicas de cada município, segundo o Ministério da
Educação (MEC), influenciam na alfabetização de adultos e idosos no Brasil. A
pasta enfatiza que a abertura de turmas do Programa Brasil Alfabetizado se dá
por meio de adesão de governos estaduais e prefeituras, que recebem recursos
federais. “É uma ação de corresponsabilidade entre
governos em que cada um tem seu foco de atuação e atribuições”, diz o MEC, em
nota. Em 2010, segundo a pasta, o Brasil Alfabetizado atendeu 1.814.522 pessoas
com 15 anos ou mais. Em 2011, 26 estados e 1.336 municípios se incorporaram ao
programa, dos quais 329 já têm a adesão concluída e os demais em análise. A
meta prevista é atender aproximadamente 2,5 milhões de pessoas. No Brasil, são
quase 14 milhões de analfabetos com 15 anos ou mais.
Ensino inexistente
A
Bahia tem presença maciça na relação das 32 cidades brasileiras sem oferta de
EJA, embora essas localidades apresentem índice de analfabetos igual ou maior
que um quarto da população adulta. O pior indicador, entretanto, está no Rio
Grande do Norte: na cidade de João Dias, 38,9% dos moradores com 15 anos ou
mais não sabem ler ou escrever. Da Região Norte, há três municípios situados no
Tocantins. No Sudeste, cinco cidades de Minas Gerais figuram na lista. A maior
parte, entretanto, é do Nordeste.
Do Estado de Minas
Redação do DIARIODEPERNAMBUCO.COM.BR
Fonte:
http://www.pernambuco.com/ultimas/nota.asp?materia=20111225103413&assunto=21&onde=Brasil