A Tarde, 29/09/2004 - Salvador BA

Mulheres alfabetizadas elevam auto-estima

Programa Brasil Alfabetizado gradua 110 turmas em todo o Estado

Marilena Neco

 

A vergonha faz parte do passado. Agora, sabendo ler e escrever, o sentimento dominante entre os alunos integrantes do Programa Brasil Alfabetizado, do Ministério da Educação, era de orgulho e felicidade. Acompanhados de parentes e amigos, eles receberam, ontem à tarde, depois de cinco meses, no auditório, lotado, da Reitoria da Universidade Federal da Bahia (Ufba), o certificado de conclusão do curso de alfabetização com um sorriso no rosto e uma nova visão do mundo na cabeça. Em todo o Estado, foram 110 turmas, 86 em Salvador. Concluíram o curso 1.320 alunos. Com a certeza de que o que parecia impossível para eles, como assinar o próprio nome, fazer contas ou ler, se tornou realidade, os alunos só têm um desejo. Continuar estudando. "Eu me sentia envergonhada e humilhada quando precisava assinar algum documento e tinha que botar o dedão ou então pedir para alguém assinar por mim. Agora estou muito feliz e satisfeita", contou Zenilda Raimunda da Silva, 63 anos, solteira, cinco filhos e moradora de Castelo Branco, durante a solenidade de entrega dos certificados.        Vendedora de amendoim e milho, ela não hesitou quando o programa chegou à sua porta. "Deixei de trabalhar e fui para as aulas. Percebi que era mais vantagem para mim, naquele momento, estudar do que trabalhar", disse ela, que até escreveu uma carta para o presidente Lula. "Pedi a ele emprego para mim e para meus filhos e melhoria para o bairro", fala. Animada, deu um conselho: "Quem não sabe ler e escrever, quando a oportunidade aparecer na porta, largue tudo e vá". Maria José da Silva Santos, casada, 12 filhos e também moradora de Castelo Branco, exibia a carteira de Identidade toda orgulhosa. "Eu mesma assinei. Quero aprender mais", assinalou feliz com o que aprendeu. Foi a primeira vez que Maria José freqüentou uma sala de aula. "Nunca achei oportunidade e comecei a trabalhar aos 10 anos. Agora não vou mais parar", informou. Para Antônia Santos Novaes, 57 anos, casada, 14 filhos, que também não sabia ler nem escrever, o mundo agora está diferente. "Este certificado significa uma vida nova para mim", acredita Antônia que, desempregada, faz planos a partir do que     aprendeu. "Eu quero trabalhar para mim mesma. Ser independente. E, se eu continuar estudando, vou conseguir", falou confiante, acrescentando que no interior não teve condições de estudar e, em Salvador, por ter que trabalhar, não freqüentou a escola. "Também nunca tive incentivo", lamentou. Quem também concluiu o curso foi o casal Roque Silva, 74 anos, e Maria José Silva, 68. Ele, mal sabia escrever o nome. Maria José, como ela mesma conta, "assinava ruinzinho, ruizinho". "Me sinto mais desenvolvido, mais vivo, mais sabido. Quanto mais a gente sabe, melhor", destacou Roque feliz. "Me sinto inteligente. Não me sentia bem em ter que perguntar o nome do ônibus às pessoas. Agora, não vou precisar mais pedir", ressaltou Maria José que, mesmo com glaucoma, não desistiu das aulas. Animados com o que aprenderam, os dois escreveram um para o outro uma carta. "Eu escrevi que amava ela de todo o coração. Ela? "Que ele é o amor da minha vida. Sem ele o mundo não tem sentido para mim. Quem não sabe ler e escrever, é cego, cego, cego", completa Maria José.