Governo importa método cubano de alfabetização
Programa é baseado em 65 aulas em vídeo, recorde para
cursos do tipo, que costumam durar de seis a oito meses. Técnicos de Cuba foram
enviados aos Estados ondeo Ministério da Pesca implementa o projeto; despesas
são pagas pelo Brasil
ANGELA PINHO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Folha de São Paulo, 21/02/2010 - São Paulo SP
Após anos de resultados tímidos no combate ao analfabetismo, o governo Lula resolveu importar de Cuba uma tentativa de atacar o problema. Há dois meses, o governo federal utiliza um método importado da ilha caribenha para ensinar pescadores a ler e escrever. O programa -chamado Sim, eu posso, ou Yo, sí puedo, no original- promete alfabetizar uma pessoa após 65 aulas em vídeo, um tempo recorde para cursos do tipo, que costumam durar de seis a oito meses. Para implantar o método, técnicos cubanos foram enviados aos cinco Estados onde o projeto está sendo implementado pelo Ministério da Pesca e Aquicultura. O governo de Raúl Castro cedeu os filmes e enviou os consultores. O Brasil paga as despesas deles no país. Para Maria Luiza Gonçalves Ramos, que coordena o programa, a principal vantagem do Sim, eu posso é que ele se adequa ao tempo dos pescadores: como eles passam longos períodos no mar ou no rio, tendem a abandonar cursos de alfabetização mais extensos. Já o Sim, eu posso pode ser encaixado no período de defeso, em que a pesca é proibida e que dura em média três meses. Depois, são feitos "círculos de cultura", com objetivo de consolidar o aprendizado. Trazido ao Brasil em 2005, em um projeto-piloto do Ministério da Educação no Piauí que acabou não tendo seguimento, o Sim, eu posso também é utilizado pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) e será aplicado neste ano em Fortaleza e João Pessoa.
Vantagens - Para a coordenadora de educação do movimento, Maria Cristina Vargas, uma das principais vantagens do método é que ele possibilita que lugares com pouca estrutura, ou com educadores menos qualificados, tenham acesso às mesmas condições de locais mais favorecidos, uma vez que a aula acontece pelo vídeo. Por outro lado, críticos apontam que o método não vai muito além da decodificação do alfabeto. Antonio Ferreira Sobrinho, professor da UFPI (Universidade Federal do Piauí) que acompanhou o projeto-piloto no Piauí, avalia que o método tira o aluno do estágio mais primário do analfabetismo, mas, diferentemente de outros programas, não enfatiza leitura e interpretação de textos. Esse, segundo ele, foi um dos motivos para o projeto não continuar no Estado -além do custo de aparelhos de TV e DVD.
Timothy Ireland, especialista em educação da Unesco (ligada à ONU) e à frente do departamento de Educação de Jovens e Adultos do MEC na época, também diz que não adianta os alunos aprenderem rápido com o Sim, eu posso se não continuarem estudando depois -com o tempo, esquecem o que aprenderam. De acordo com ele, a avaliação da aplicação do método no Piauí indicou que a eficácia da iniciativa estava mais ligada ao fato de os alfabetizadores terem tido treinamento prévio e acompanhamento ao longo do programa do que ao método em si. Cerca de 80% dos que participaram dos cursos foram considerados alfabetizados. Embora venha ganhando espaço no país nos últimos anos, o Sim, eu posso é ainda minoritário entre os métodos de alfabetização usados no Brasil e tem uma abrangência pequena.