Expansão do ensino técnico não resolverá desafios do ensino médio
29/04/2011, Portal IG Educação
Especialistas comemoram ampliação das vagas, mas lembram que
currículos da etapa escolar precisam ser mais variados
A expansão do ensino técnico – demanda antiga dos estudantes brasileiros – se tornou promessa de governo da presidenta Dilma Rousseff e aposta de solução para aumentar a qualidade da pior etapa da educação, o ensino médio. Para os especialistas, no entanto, o projeto apresentado nesta quinta-feira, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), não resolverá as demandas dos jovens brasileiros matriculados nessa fase. Eles lembram que os anseios dos adolescentes são múltiplos e temem que a ampliação da rede profissional anunciada pela presidenta reduza essa visão. “A educação básica tem um problema crônico que precisa ser resolvido. Integrar o ensino técnico ao médio não vai solucioná-lo”, ressalta o professor aposentado da Universidade Federal Fluminense Gaudêncio Frigotto. Estudioso dos temas que envolvem a educação profissional há mais de 20 anos, ele defende que os anseios da sociedade devem fazer parte dos projetos educacionais. Isso significa, segundo ele, diversificar as atividades oferecidas na escola. “Escola não é só laboratório. É cultura, sociabilidade, arte, música”, diz.
Francisco Cordão, presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de educação (CNE), afirma que os investimentos na educação profissional não podem ser feitos de forma “isolada”. Para ele, o Pronatec, que dará bolsas e financiamento a estudantes do ensino médio de escolas públicas e trabalhadores que buscam formação profissional, é uma boa iniciativa. Porém, os projetos pedagógicos dos cursos deverão estar integrados ao do ensino regular para ter eficácia.
O programa anunciado por Dilma pretende beneficiar 8 milhões de brasileiros em quatro anos. Além dos estudantes, trabalhadores e participantes de projetos de inclusão social, como o Bolsa Família, terão direito a bolsas de estudo ou financiamento de cursos, nos moldes do programa de financiamento estudantil para o ensino superior. As vagas serão oferecidas na rede pública (federal e estaduais), em escolas privadas e pelo Sistema S – conjunto de entidades como o Senac, Sesc, Senai, SESI.
Assim como ocorreu com o Programa Universidade para Todos (Prouni) – que distribui bolsas de estudos em instituições privadas de ensino –, pesquisadores se preocupam com a parceria entre o governo e as instituições privadas. Para Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, há um risco de oferecer formação de má qualidade aos jovens em nome do aumento de vagas. “Não se justifica comemorar só a expansão. A demanda dos jovens é a entrada no mundo do trabalho. Mas ela não é garantida só com o diploma. Depende da qualidade da formação”, ressalta. Cara reconhece que o Sistema S, principal parceiro do governo no projeto, oferece cursos de qualidade, mas lembra que eles não serão os únicos parceiros. “E não há um controle social sobre a oferta de bolsas de estudo da entidade, que já recebe muitos recursos públicos”, critica. Frigotto teme também que o governo financie vagas que terminem não sendo preenchidas por estudantes. “Se os empresários não valorizarem as carreiras, com bons salários, por exemplo, os jovens vão continuar querendo seguir outros caminhos”, ressalta.
Reinserção social - Uma das frentes previstas no projeto de lei que cria o Pronatec e que será avaliado pelo Congresso Nacional é a concessão de bolsas de estudo a participantes de programas de inclusão. É o caso, por exemplo, dos pais dos estudantes beneficiados pelo Bolsa Família. Os critérios de distribuição não são claros, mas a proposta é qualificar esses trabalhadores. Com isso, além de reinseri-los no mercado de trabalho, haveria um ganho educacional. Estudos mostram que a influência de pais escolarizados contribui para o aprendizado das crianças. “A ampliação da rede técnica é um esforço positivo, mas há desafios enormes a cumprir ainda, como aumentar os investimentos em educação. Com a interiorização das escolas técnicas, por exemplo, muitas unidades ainda não possuem professores”, diz.
Priscilla Borges, iG Brasília