Folha de São Paulo, 14/08/2003 - São Paulo SP

Enem privilegia capacidade de interpretar textos e relacionar informações

Questões não são separadas por matéria e, para resolvê-las, não basta usar conteúdo visto em aula

André Nicoletti da Reportagem Local

 

Em um vestibular clássico, o candidato encontra uma questão de química e, para resolvê-la, pode abrir o seu "arquivo mental" onde estão os conteúdos aprendidos dessa disciplina. Nada disso acontece no Enem. Não há matérias específicas, não são cobrados só os conhecimentos decorados e apenas um ano de preparação não é o suficiente para ter um bom desempenho. Uma característica do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) é desprezar os conteúdos e privilegiar as chamadas habilidades e competências, como a capacidade de relacionar informações, de elaborar propostas de intervenção e de interpretar textos. Para responder às questões, o candidato não terá apenas de lembrar uma fórmula que decorou em aula, mas precisará interpretar o texto do enunciado, raciocinar em cima de algumas situações -muitas vezes do cotidiano- e elaborar uma          solução. Como situações reais quase nunca envolvem só uma área do conhecimento, é a partir delas que o Enem dá ênfase à chamada interdisciplinaridade, em que uma mesma pergunta geralmente envolve diversas matérias. Isso não quer dizer, entretanto, que a prova seja mais difícil. "As questões do Enem são muito tranqüilas. A interdisciplinaridade não significa a soma das dificuldades de todas as matérias", disse Carlos Eduardo Bindi, coordenador do Etapa. A maior dificuldade do exame é a duração de cinco horas, segundo Rodrigo Pauleschi de Araújo, 19, que irá fazer a prova pela terceira vez. "Em cinco horas, não é possível não sentir fome, cansaço ou dor de cabeça. Costumo fazer uma pausa de uns dois minutos no meio da prova para dar uma relaxada", disse ele, que tentará acertar mais do que as 43 questões que conseguiu no ano passado, já que os vestibulares     costumam aproveitar a maior nota.

 

Para se preparar para o exame, segundo professores de cursinho, apenas alguns meses não bastam, já que é preciso desenvolver habilidades e competências, o que é mais difícil do que decorar conteúdos. "O estudante não precisa de uma preparação especial para o Enem. O bom desempenho depende de todo o estudo anterior da pessoa, do quanto ela lê, do quanto está ligada na sociedade, do quanto consegue interpretar textos", disse Eva Albuquerque, professora do Cursinho da Poli. Já o coordenador do Anglo Sezar Sasson afirma que, mesmo não sendo exigidos na prova, os conteúdos são importantes para desenvolver habilidades e competências. "Não se pode formar as habilidades em cima do nada. O conteúdo é a matéria-prima."