Educadores
questionam nova base do ensino médio
26/03/2012
Especialistas
se dividem quanto à utilidade das diretrizes do MEC homologadas neste ano
Dar
identidade à etapa mais problemática da educação básica em 23 artigos de uma
resolução e em 50 páginas de um parecer, permitindo que as escolas permeiem
seus currículos com os conteúdos de quatro dimensões: trabalho, ciência,
tecnologia e cultura. É esse o objetivo das novas diretrizes curriculares para
o ensino médio, homologadas pelo Ministério da Educação (MEC) no início do ano,
que tem recebido críticas de especialistas quanto à sua utilidade. As novas
diretrizes tentam inserir "procedimentos que guardem maior relação com o
projeto de vida dos estudantes como forma de ampliação da permanência e do
sucesso dos mesmos na escola". Ou seja, tentam deixar a escola mais
atraente com a ideia de inserir conteúdos relacionados às quatro dimensões na
base curricular. Na prática, as escolas são obrigadas a discutir o documento -
que é mais doutrinário que mandatório -, mas sem desobedecer à Lei de
Diretrizes e Bases da Educação, onde estão fixadas as disciplinas obrigatórias.
Os
críticos afirmam que o documento apenas legitima o que já existe: uma enxurrada
de disciplinas que são voltadas para o vestibular. "O Brasil não
diversifica e mantém a ideia que todo mundo tem de fazer a mesma coisa. É um
'pau de sebo', um sistema que mais expulsa que inclui", diz João Batista,
do Instituto Alfa e Beto. Para ele, o texto das diretrizes tem uma
"erudição boba". "Não vai mudar nada. Isso das quatro dimensões
é só envelope. As escolas não vão deixar de dar o que cai na Fuvest. " O economista
Cláudio Moura e Castro tem opinião semelhante. "O vestibular é coisa para
gênio. É uma montoeira de matéria que rebate no ensino médio. Resultado:
ninguém aprende, só decora", afirma. "No resto do mundo há
segmentação. Só a Alemanha tem quatro alternativas. Os Estados Unidos têm um
programa muito aberto e dificilmente um aluno faz os mesmos cursos que o
outro."
Para
especialistas em educação básica, as novas diretrizes não resolvem o problema,
mas apresentam pontos positivos. "São mais verborrágicas que
práticas", diz Wanda Engel,
do Instituto Unibanco. Ela elogia a possibilidade de flexibilização
da grade em regimes semestrais e as matrículas por disciplina. Priscila Cruz,
do Todos pela Educação, afirma que o ensino médio precisa de um projeto muito
mais estruturante. "Acredito em soluções mais individualizadas e segmentadas,
porque há muitas diferenças. E a escola tem de fazer sentido para todos os
estudantes." Currículo. O CNE defende que as diretrizes, que revogam as
até então vigentes, datadas de 1998, são um documento norteador, uma vez que ele não pode ser encarado como
o currículo em si. O MEC discute hoje uma nova base curricular nacional, que
vai contemplar também o ensino médio, denominada direitos de aprendizagem.
"Demos
uma definição para o ensino médio. Todo mundo tem direito a uma quantidade de
informações e então escolher o que quer fazer. Não é receita de bolo", diz
o relator José Fernandes de Lima. Ele admite que há
dificuldade de implantação e que o projeto é de médio prazo. Clélia Brandão,
também do CNE, afirma que o documento é um "resultado de opções". "Nem todo mundo pensa a escola do mesmo jeito. Não tem
como ser unanimidade nacional. Fruto de discussão do Conselho Nacional de
Educação (CNE) com educadores e entidades, o documento tenta aproximar a escola
da realidade dos jovens, sem retirar a importância das disciplinas
tradicionais. No entanto, o cenário que ela encontra é desastroso e apresenta
uma equação problemática cujo resultado não fecha há décadas. Alguns números
mostram a gravidade: 50,9% dos jovens de 15 a 17 anos ainda não estão matriculados
nessa etapa e as taxas de reprovação e de abandono são, respectivamente, de
13,1% e de 14,3%. Apenas 11% aprenderam o ensinado em matemática ao final do
3.º ano.
MARIANA MANDELLI
O Estado de São Paulo - São Paulo SP