Alessandra Moura Bizoni
Folha Dirigida, 04/05/2010 - Rio de Janeiro RJ
O desafio de vencer o analfabetismo no Brasil é difícil de ser superado a curto prazo: são 14 milhões de analfabetos absolutos e mais 40 milhões de analfabetos funcionais. Professora do Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenadora do Grupo de Trabalho de Educação de Jovens e Adultos (EJA), vinculado ao Projeto Fundão do IM/UFRJ, e colaboradora na área de Matemática do Projeto Letramento de Jovens e Adultos da UFRJ, Marisa Leal acredita que oito meses são insuficientes para alfabetizar jovens e adultos com sucesso, como pretende o Brasil Alfabetizado. "O Programa Brasil Alfabetizado tem objetivos ambiciosos, difíceis de serem alcançados em um curto prazo. Alfabetizar jovens, adultos e idosos em um prazo máximo de oito meses com 320 horas-aulas, ou um pouco mais, é uma tarefa quase impossível. O processo de alfabetização é mais amplo do que a compreensão dos códigos de leitura e escrita", argumenta a educadora.
Nesse sentido, a professora do Instituto de Matemática da UFRJ salienta que a codificação e decodificação dos códigos ortográficos e numéricos é apenas uma das etapas a serem vencidas quando falamos da alfabetização como parte de um processo de letramento, que inclui a leitura e escrita da linguagem matemática, muitas vezes esquecidas. "Se metas mais concretas em relação às oportunidades de continuidade de estudos na educação básica ou qualificação profissional não forem estabelecidas pelo governo, não estaremos promovendo a real alfabetização desses brasileiros, que foram excluídos dos bancos escolares", revela a docente. Mesmo assim, Marisa Leal reconhece os avanços resultantes das ações do programa, iniciado em 2003. "Com base nos dados de 2007, o estudo publicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura (Unesco), o programa desde a sua criação, no ano de 2003 até o ano de 2008, já formou cerca de 9,8 milhões de alfabetizandos e projeta para o ano de 2010 uma meta de atendimento a 2,5 milhões de pessoas", assinala a colaboradora na área de Matemática do Projeto Letramento de Jovens e Adultos da UFRJ.
Um dos problemas do programa Brasil Alfabetizado, explica Marisa Leal, é que muitas das pessoas atendidas não são pessoas analfabetas, mas adultos com baixa escolaridade. "Ao analisar estes dados, merece destaque o que nos assinala Vera Masagão de que parte dos milhões de adultos atendidos não eram de fato os que se declaram analfabetos, mas pessoas com baixa escolaridade. Assim, tal atendimento não afeta, portanto, as estatísticas nem atende adequadamente às necessidades educativas do público atendido", completa Marisa Leal. Outro aspecto assinalado pela educadora diz respeito à valorização e qualificação dos profissionais. Segundo a professora, o Brasil Alfabetizado admite que seus alfabetizadores possuam nível médio completo e que apenas preferencialmente possuam nível superior, sejam professores da rede pública ou possuam experiência anterior em educação de jovens e adultos.
"Os professores alfabetizadores recebem R$250 por turma de no mínimo 7 e no máximo 25 alunos (em áreas urbanas) enquanto os coordenadores de curso recebem R$500, devendo satisfazer as mesmas exigências feitas aos alfabetizadores no que tange à qualificação profissional, para acompanhar, na área urbana, de 7 a 15 turmas de alfabetização. Esses profissionais, além do trabalho nas salas de aula, devem participar de projetos de Formação Inicial e Continuada", informa a coordenadora do GT de EJA. Segundo a professora da UFRJ, a baixa remuneração afasta os professores do programa Brasil Alfabetizado. "O valor irrisório pago por essas bolsas não atrai professores do quadro das secretarias municipais e estaduais de educação nem da rede particular de ensino. Com isto, o programa continua com um grande número de alfabetizadores que muitas vezes nunca entraram numa sala de aula. Não é possível se falar em qualidade de ensino sem falar em professores bem preparados e dignamente remunerados", completa a educadora.