Brasil está atrasado no ensino médio, diz diretor do Unicef

Observação de Nils Kastberg diz respeito ao fato de, no Brasil, a matrícula de jovens no ensino médio não ser obrigatória. Com obrigatoriedade, pais podem ser responsabilizados; MEC se diz favorável à implantação, aprovada em lei na Argentina há dois anos

Folha de São Paulo, 15/09/2008 - São Paulo SP

FÁBIO TAKAHASHI ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES 

 

O Brasil está "atrasado" no atendimento ao ensino médio (antigo colegial), afirma o diretor do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) na América Latina, Nils Kastberg. Ele se refere principalmente à obrigatoriedade da matrícula dos jovens na etapa. No Brasil, há obrigação apenas aos estudantes com idade para cursar o ensino fundamental (antigos primário e ginásio). Com a obrigatoriedade, o Poder Público e os pais podem ser responsabilizados civil e criminalmente caso o jovem esteja fora da escola. A Argentina aprovou uma lei há dois anos que prevê a ampliação. O Chile, que já a possuía, pretende implementar neste ano a obrigatoriedade também na educação infantil. "Lógico que o Brasil está atrasado ao não ter educação média obrigatória", disse Kastberg, em entrevista durante o seminário organizado pela Unicef, em Buenos Aires, que debateu o ensino médio. "O Brasil é a décima potência econômica mundial, precisa ter como objetivo ser também a décima potência quanto a seus recursos humanos. Hoje, está muito distante disso."  Atendimento - Segundo dados do Ministério da  Educação, 81% dos jovens brasileiros entre 15 a 17 anos estão na escola, mas apenas 44% no ensino médio (os demais repetiram e seguem na educação fundamental). A Constituição brasileira afirma que "o dever do Estado com a educação será efetivado mediante garantia de progressiva universalização do ensino médio gratuito" -ou seja, não determina um prazo para isso. Para tornar obrigatória essa etapa, seria necessário mudar a legislação. Kastberg afirma que a medida seria importante para que o ensino médio seja "um direito e uma obrigação". Os representantes da Secretaria da Educação Básica do MEC afirmam que são favoráveis à mudança. "Nunca conversei com o ministro [Fernando Haddad, da Educação] sobre a obrigatoriedade, mas a vejo como positiva", afirmou a titular da secretaria, Maria do Pilar. "O que posso dizer pelo MEC e o governo federal é que temos criado condições para garantir o acesso e a permanência dos jovens no ensino médio, com mecanismos como o Fundeb [fundo que paga aos Estados por aluno matriculado], Bolsa Família e a oferta de livros didáticos. Ou seja, as condições  hoje são mais favoráveis para esse debate", disse Pilar. Coordenador-geral do ensino médio do MEC, Carlos Artexes Simões disse que "a obrigatoriedade traz impacto político importante" para aumentar o atendimento.

Trabalho - Uma das dificuldades apontadas por educadores para a implementação da obrigatoriedade, além da necessidade de expansão da oferta de matrículas, é a de retirar os jovens do mercado de trabalho. Segundo dados do governo federal, metade dos jovens entre 15 e 24 anos trabalha. "Quando se torna o ensino médio obrigatório, você tira as instituições do lugar. O jovem não pode trabalhar. Por isso, precisamos debater isso dentro do próprio governo e com a sociedade", disse Pilar. Para o diretor da Escola de Formação Contínua da Universidade Alberto Hurtado (Chile), Carlos Concha, o aumento da escolarização é necessária para melhorar a qualidade dos postos de trabalho, ainda que haja dificuldades durante o período escolar. O jornalista FÁBIO TAKAHASHI viajou a convite do Unicef