Brasil Alfabetizado já consumiu R$ 2 bilhões sem resultados

Domingo, 4 de Outubro de 2009

 

 

A denúncia é do site Contas Abertas:

 

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostram que a proporção de analfabetos no Brasil caiu de forma insignificante de 2007 para 2008, embora o número absoluto tenha aumentado. Enquanto isso, o orçamento do programa Brasil Alfabetizado, lançado em 2003 com o objetivo de erradicar o analfabetismo entre jovens e adultos, já consumiu R$ 2,1 bilhões do orçamento federal. Mesmo assim, o índice de analfabetismo caiu apenas 13% de lá pra cá, segundo o IBGE. Mais de 14 milhões de brasileiros jovens e adultos ainda não sabem ler e escrever.

A execução orçamentária do Brasil Alfabetizado é satisfatória se comparada a outros programas do Ministério da Educação (MEC). Desde 2004, foram aplicados no principal programa de alfabetização do governo federal mais de 90% do valor autorizado em orçamento para os exercícios. Em 2004, foram destinados R$ 181,9 milhões para o programa. No ano seguinte, teve o maior gasto - R$ 625,3 milhões. A verba prevista para este ano é de R$ 301,6 milhões e já foram aplicados R$ 237,5 milhões.

É para o projeto de “apoio a alfabetização e a educação de jovens e adultos” que o programa destina a maior parte dos recursos – R$ 1,1 bilhão nos últimos seis anos, o equivalente a 52% de todo o montante gasto neste período. Mas apesar dos esforços governamentais, o levantamento do IBGE demonstra que a situação de analfabetismo, sobretudo entre a população mais velha, ainda é grave. Entre os pesquisados com idade de 25 anos ou mais, embora tenha havido queda, concentra-se a maior proporção de brasileiros que não sabe ler nem escrever. Enquanto isso, jovens de 15 a 17 anos e de 17 a 24 mantiveram os índices de um ano para o outro.

"O analfabetismo entre adultos ainda é preocupante", admite o ministro da Educação, Fernando Haddad, que classificou como “inaceitável” a queda de apenas 0,1% na taxa de analfabetismo. O número sinaliza que um em cada dez brasileiros adultos não consegue escrever um bilhete simples. São 14,2 milhões de brasileiros nessa situação. O ministro destaca que nas regiões em que há mais adesão ao Brasil Alfabetizado a redução foi menor. Ele se mostrou otimista em relação aos resultados regionais do analfabetismo. "O exemplo do Nordeste evidencia que é possível fazer essa redução", exemplificou. A região concentra cerca de 80% das turmas do programa e de 2007 para 2008 registrou a maior queda na taxa de analfabetismo: 0,5%.

O Ministério da Educação nega que o Brasil Alfabetizado tenha fracassado ou que possa que ser suspenso. No entanto, a pasta reconhece problemas de foco do programa, pois o número de "alfabetizandos" registrado a cada ano não se reflete na redução do analfabetismo. O secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC disse à Folha de S.Paulo que "não brigaria com os números" do IBGE e que a queda do analfabetismo não é proporcional ao esforço do governo.

O MEC também informou que a amplitude do programa depende de parcerias com estados e municípios. A pasta afirmou ainda que a proporção de analfabetos entre pessoas de 15 a 29 anos está abaixo dos 5% da população nessa faixa etária, o que é considerado uma taxa "civilizada" pelo ministério.

A deputada estadual Teresa Leitão (PT), que preside a Comissão de Educação da Assembléia Legislativa de Pernambuco, concorda com a posição do ministério e acredita que a estrutura do programa Brasil Alfabetizado tem ajudado. “Sobre os investimentos, eu não tenho escutado nenhuma reclamação. Pelo menos aqui em Pernambuco, o programa tem ajudado bastante o governo do estado”, afirmou em entrevista ao Contas Abertas.

Por outro lado, a deputada observa que muitas vezes há falhas no programa nos estados e municípios. “Apesar de ser do governo federal, o programa é implementado pelos governos estadual e municipal, onde há diferenças por conta da execução variada de concepção local”, argumenta. “Percebemos que em algumas políticas a autonomia dos estados e municípios muitas vezes distorce o programa federal”, completa. Teresa Leitão também critica o monitoramento do programa. “Tem que acompanhar o número de alunos, sobretudo, a permanência deles no programa. Já é uma faixa etária difícil para estudar e, para permanecerem, têm que ter muita força de vontade, muito estímulo, para não vermos dados diminuídos em termos da abrangência”, alerta.

Na região Sudeste, onde o resultado do analfabetismo aumentou na faixa mais jovem da população pesquisada, de 10 a 14 anos, o problema se manteve, percentualmente, na faixa etária de 25 anos ou mais, na relação entre os resultados de 2007 e 2008. Em Minas Gerais, segundo a subsecretaria de desenvolvimento da educação básica da Secretaria de Educação do estado, Raquel Santos, o programa Brasil Alfabetizado foi responsável por um grande apoio ao estado. Mas ela acredita que a taxa de analfabetismo não cairá se não houver investimentos para compra de material pedagógico especifico para a alfabetização de adultos e a preparação dos professores.

Para a “distribuição de materiais e livros didáticos”, o Brasil Alfabetizado também destina recursos específicos todos os anos. Já foram aplicados pelo menos R$ 15,4 milhões para este fim desde 2004. Este ano, no entanto, dos R$ 12 milhões autorizados para o projeto no orçamento do programa, somente R$ 105,2 mil (0,9%) foram desembolsados – e com dívidas de anos anteriores, os chamas “restos a pagar”. “Essa falta de material especifico para a alfabetização de adultos é ainda muito grande. Passam anos, faz-se o censo e às vezes só se consegue vencer 1%, 0,8% do analfabetismo”, lamenta Raquel Santos.

Outro ponto criticado pela subsecretária é qualificação de pessoal, que, segundo ela, é ainda mais carente. “É preciso desenvolver uma proposta diferenciada para a alfabetização de adultos. Na hora que você vai trabalhar com jovens e adultos, tem que ter uma formação específica, especialmente na psicologia do adulto, para saber como se trabalha com essas pessoas”, observa. “Quando esse adulto já tem um certo nível de alfabetização é mais fácil criar alternativas, mas quando não é alfabetizado, é preciso material específico”, enfatiza.

Neste sentido, o orçamento do Brasil Alfabetizado já destinou pelo menos R$ 63,9 milhões nos últimos anos. É, porém, no projeto de “concessão de bolsa para equipes de alfabetização” que são destinados o segundo maior volume de recurso do programa – R$ 866 milhões de 2004 a 2009. O objetivo das bolsas é estimular a participação de voluntários, tradutores intérpretes de libras e coordenadores de turmas de alfabetização, no processo de alfabetização de jovens e adultos. Os recursos são usados para a atualização e custeio das despesas realizadas no desempenho de suas atividades no processo de alfabetização.

Raquel Santos diz que a formação de professores e a compra de materiais que “falem a língua” dos jovens e adultos deveriam vir antes da elaboração de grandes campanhas e projetos. “Todo dinheiro que entrar é bem-vindo. Em educação a gente não gasta, investe. Capacitação de professor não é barato mesmo. Às vezes tem que tirar o professor de um lugar para dar a formação continuada, e colocar outro no lugar. Mas esse investimento tem que ser feito”, completa.

A subsecretária destaca ainda uma boa prática no estado de Minas, visando coibir o analfabetismo funcional, classificação dada para aqueles que foram alfabetizados, mas apresentam dificuldades em interpretar textos e não têm muita habilidade na escrita. “Aqui em Minas estamos investindo pesado nos alunos dos anos iniciais, para que eles adquiram essas habilidades de competência para que isso faça diferença na trajetória escolar deles”, conclui.

 

Fonte:

http://por-outrolado.blogspot.com/2009/10/brasil-alfabetizado-ja-consumiu-r-2.html