> Estado de Minas, 05/02/2007 - Belo Horizonte MG

Alfabetização de adultos vai mudar

Governo federal pretende substituir professores leigos por docentes da rede pública. Projeto ameaça 45 mil empregos

Erika Klingl 

 

Brasília – Um exército formado por, pelo menos, 45 mil brasileiros que trabalham para combater o analfabetismo no país, sem nenhuma formação – os alfabetizadores leigos, ou melhor, alfabetizadoras, já que 84% dos professores do programa Brasil Alfabetizado são mulheres, de acordo com dados do Sistema Brasil –, está com seu emprego ameaçado. Convencido de que o programa Brasil Alfabetizado falhou no combate ao analfabetismo, o Ministério da Educação (MEC) vai substituir os leigos por professores da rede pública. A perspectiva do ministro da Educação, Fernando Haddad, é a de que a oferta de uma bolsa para professores, principalmente da primeira à quarta série, vai trazer 60 mil educadores assim que a mudança for implementada. O valor da bolsa foi pensado inicialmente em R$ 260, mas alguns estudos do MEC indicam que o adicional pela alfabetização pode ser de R$ 220 por mês. O valor parece baixo, mas representa quase a metade do salário de um professor da rede pública de ensino no Nordeste, onde estão a maioria dos alfabetizadores. A região tem uma taxa de analfabetismo de 26%, o dobro da média nacional. As organizações não-governamentais (ONGs) e as entidades de classe, como o Serviço Social da Indústria   (Sesi), tradicionais parceiros do programa, não serão cortadas do programa. Mas a participação deve ser reduzida significativamente. “A idéia é deixar uma espécie de margem de 15% para leigos que trabalham em entidades com excelência reconhecida e com certificado”, afirma Fernando Haddad. Na prática, isso representa a exclusão de cerca de 33 mil pessoas do programa. Hoje, para se ter uma idéia, 32% das aulas são dadas na casa do alfabetizador, 4% em igrejas e 2% em salões paroquiais do bairro. Pacote A proposta precisa passar pelo Congresso Nacional, já que atualmente a União é proibida de fazer pagamento direto a professores municipais e estaduais. A minuta do projeto de lei está pronta e deve ser apresentada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos próximos dias. A idéia é incluir as mudanças do Brasil Alfabetizado no “pacote de cidadania”, plano que faz parte das propostas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No texto, o governo federal deve deixar a capacitação dos professores a cargo de estados e municípios, oferecida pela própria rede de ensino básico ou por meio de parceiras com universidades públicas. Essa qualificação, de acordo com o ministro, será positiva para as crianças que estudam na rede   pública por dois motivos. O primeiro está relacionado ao fato de os professores estarem melhor habilitados na hora de ensinar. O segundo é mais profundo: pais letrados ajudam os filhos na escola. De acordo com Fernando Haddad, a mudança é necessária para dar novo ritmo ao combate ao analfabetismo. Hoje, o país tem quase 15 milhões de jovens e adultos sem saber ler nem escrever. O número é menos de 1% do que havia em 2003. A convicção do ministro esbarra na resistência dos atuais parceiros da alfabetização do país. Osmar de Oliveira Aguiar, do Centro de Educação Paulo Freire de Ceilândia (DF), duvida da eficácia da mudança. “O programa de alfabetização tem que ser feito por meio de uma campanha maior, um programa de alfabetização que vá em cada canto do país. As escolas não têm estrutura para isso”, afirma. Para ele, a saída é a capacitação dos alfabetizadores leigos porque são eles que estão próximos da casa dos quase 15 milhões de adultos analfabetos. "O programa de alfabetização tem que ser feito por meio de uma campanha maior, um programa de alfabetização que vá em cada canto do país. As escolas não têm estrutura para isso" • Osmar de Oliveira Aguiar , do Centro de Educação Paulo Freire de Ceilândia (DF)